Um novo paradigma na Segurança Social
Documento Elaborado por: António José Duarte (Economista) - antonio.duarte@gmail.com Marco Capitão Ferreira (Jurista) - mcferreira@mail.fd.ul.pt
Os autores escrevem regularmente no Blog Vícios Públicos Virtudes Privadas
Lisboa, Outubro de 2005
Declaração Inicial
As tendências demográficas constantes nos últimos anos, resultante de uma melhoria clara da esperança média de vida a nível global, diminuição das taxas de mortalidade infantil, associada ao facto de os incentivos a uma política de natalidade no quadro sociológico português, conduziram o sistema de segurança social português para uma quase falência financeira.
A base da segurança social, e da sua sustentabilidade resulta claramente de equilíbrio constante entre o número de contribuintes activos e do número de beneficiários do mesmo sistema. A política de natalidade resultante da 2ª guerra mundial e que ficou conhecida como o baby-boom, cobra agora ao Estado esse notável esforço de rejuvenescimento da população, com a pirâmide demográfica a apresentar um alargamento do topo. Hoje é tempo de substituirmos o termo ?baby-boom? por ?papy-boom?.
Esta cobrança coerciva, unilateral, e sem quaisquer hipóteses de adiamento, agrava-se, no caso português, face à elevada dependência da população em relação ao empregador Estado.
Resolver, a questão da segurança social, é um passo importante, e decisivo, para Portugal. Resolver desde já a sua sustentabilidade, a garantia extrema do pagamento das reformas, daqueles que hoje com 20 anos, iniciam a sua progressão de carreira, e simultaneamente, as suas contribuições para o sistema, seria o melhor sinal que o Estado poderia transmitir.
Apoiar hoje, em 2005, a ideia de que a falência do sistema é algo que ainda vem longe, é apenas e tão só, alinhar pelo diapasão da mentira e do facilitismo. È verdade que para se reformar algo como a segurança social, terão que ser dados passos importantes, e dolorosos, mas não é menos verdade que não agir significa apenas esperar sentado o desastroso final que desde já se pode compreender.
É, pois, tempo de tomarmos uma decisão.
Este documento pretende ser um ponto de partida para que se possa encetar essa discussão, tão necessária, que deve ser feita de uma forma abrangente, por toda a sociedade, incluindo a classe política e decisória.
Tendências Demográficas em Portugal
A população residente em Portugal era no final do ano de 2003, estimada em 10.474.685 indivíduos, divididos em 5 066 308 homens e 5 408 377 mulheres. Com uma variação face ao ano de 2002, de 0,64 % , a população portuguesa, cresceu 0,61 % devido ao fluxo migratório e apenas 0,04 % devido ao crescimento natural.
Este primeiro parágrafo, dispara para uma conclusão. Apesar de o saldo natural ainda ser positivo, é um facto que a população portuguesa cresce apenas graças à imigração proveniente dos países de Leste, África e Brasil, e não pelo nascimento. Não há por isso um rejuvenescimento da população. Mas deve haver, também por isso, um cuidado extremo na formulação das políticas de imigração e da concessão de autorizações de residência estáveis.
Em 2003, o número de nascimentos de crianças vivas em Portugal foi de 112 589, traduzindo um decréscimo de 1,6 % face ao ano anterior.
No entanto existem aqui dois factores de importância relativa:
Compreender, também o porque de tal diminuição, passa por perceber o porque da inexistência de políticas activas de promoção de natalidade, podendo mesmo dizer-se que em determinadas situações, o Estado promove a política de não natalidade, quer no acesso ao trabalho, quer nas parcas comparticipações que fornece a famílias mais carenciadas.
Mortalidade em Portugal
No ano de 2003, a taxa de mortalidade fetal tardia, situou-se nos 3,1 por 1000, o que significou 508 óbitos. A evolução neste indicador, revelador da significativa melhoria das condições de vida e acesso aos cuidados básicos de saúde, fica demonstrada na diminuição constante a que assiste desde 1960.
A taxa de mortalidade fetal tardia era de 26,5 por mil em 1960, reduzindo-se para metade em 1980, para um terço na década de 90 e para valores abaixo de 4 por mil neste século.
Apresenta uma semelhança na evolução face ao indicador acima ocorrido. Em 2003, a taxa de mortalidade infantil ? óbitos de crianças com menos de 1ano por 1000 nados-vivos ? situou-se nos 4,1 por mil. De referir que em 1960, o mesmo indicador era motivo de vergonha nacional, ao apresentar 77,5 por mil, sendo que só em 1990, na sequência da clara melhoria induzida no acesso a programas de vacinação nacional e a erradicação de algumas doenças infantis que ainda perduravam em Portugal, foi possível apresentar uma taxa abaixo dos 10 por 1000.
Em 2003, 109 148 portugueses perderam a vida. Um aumento de 2,3 % face ao ocorrido ao ano de 2002, sendo que 80 % dos óbitos ocorridos, surgem em indivíduos com mais de 65 anos de vida.
Primeiros Passos para o entendimento do problema
Perceber o porque do decréscimo do saldo natural, que se verifica em Portugal, passa por olhar em primeiro lugar, para os números do casamento e dos divórcios ocorridos em Portugal, nas últimas décadas.
Um Estado que se quer moderno, tem que promover fortes políticas de natalidade e de promoção da mesma. Um Estado que se quer jovem e com uma massa crítica em constante evolução, tem que obrigatoriamente dar o sinal, estimulando através de medidas financeiras e não só, a natalidade. Longe, de pretendermos ser uma cópia da Suécia, até porque o país não possui capacidades financeiras inesgotáveis, mesmo que existisse uma correcta equidade fiscal, é importante que alguns pontos sejam tidos em atenção.
Mesmo sem ainda se ter abordado o problema, é um facto que qualquer sistema mundial de segurança social, não poderá funcionar num quadro onde existe uma aproximação entre beneficiários do sistema e contribuintes do mesmo. Em Portugal é essa a realidade.
A verdade é que base nuclear da natalidade ? a família ? tem se vindo a desmembrar ao longo dos anos. Mas não é menos verdade que em 2003, 29,0% dos nascimentos ocorreram fora do casamento ? com co- habitação.
Dentro ou fora do casamento, é certo que é hoje mais díficil, para muitas famílias portugueses, financeiramente, assumirem a vontade de um filho, seja ele o primeiro ou não.
São os elevados custos pré-natais, são mais ainda os elevados custos em infantários e creches, e para a mulher, ter um filho, hoje, significa muitas vezes, um forte revés na carreira profissional. Obviamente que esta caracterização é a mais próxima da realidade portuguesa.
Uma parte da solução, passa por restaurar, ou melhor por eliminar a aproximação verificada entre contribuintes e beneficiários do sistema de segurança social. Uma maior taxa de natalidade, traduz-se não só em mais descontos futuros, como na criação de uma maior capacidade de criação de riqueza a nível nacional.
Entender as tendências macro-económicas
Numa valência única exclusivamente macroeconómica, não é possível afirmar com exactidão em que ano se verificará o colapso do esquema público de protecção social português. Mas é possível afirmar que tal acontecerá num intervalo entre 2020 e 2028. Por muito que agora se faça, por muito meritórias que sejam as medidas agora levadas a cabo, elas não resolvem o problema. Apenas e só adiam.
Há importantes sinais que mostram que o estado financeiro se tem vindo a deteriorar.
Dificilmente serão atingidos os valores que o governo prevê, quer para o crescimento esperado tanto a nível da procura agregada, quer ao nível do consumo e do investimento. O consumo privado dificilmente registará uma aceleração tão forte como a prevista (2,3 %), pois se por um lado uma pequena melhoria do nível do emprego e o efeito da redução dos escalões mais baixos do IRS, poderá influenciar positivamente a despesa das famílias, por outro lado, o efeito das subidas das taxas de juros no seio da UEM com consequente aumento do serviço da dívida das famílias portuguesas tenderá a eliminar por completo a melhoria esperada no consumo privado.
A taxa de desemprego em Portugal, atingiu os 7,1 % no final do 4º trimestre de 2004, o valor mais elevado verificado desde o 1º trimestre de 1998 (6,0%). Se tomarmos em linha de conta, que nos últimos 2 anos, a taxa esteve sempre acima dos 6,0%, e atendendo à cada vez menor competitividade da economia portuguesa, associada às quebras no crescimento do PIB, é natural que o desemprego suba. De uma forma não especulativa o desemprego em Portugal chegará rapidamente aos 10 %, e nem a sociedade está preparada para tal, nem a segurança social para os desembolsos que dai advirão.
É um problema que França e Alemanha, conhecidas no seio da União Europeia, por não respeitarem o PEC, têm hoje. De que lhes valeu, argumentarem com a necessidade de manterem os fluxos de transferências sociais por forma a manterem o emprego?
No fundo, os 7,5% de desemprego em Portugal, actualmente, representam e sem contarmos com o nível de trabalho temporário da economia portuguesa, e sem o trabalho precário, uma importante fatia da população portuguesa, que não tem como exercer e produzir.
Isto acontece, também pelas razões externas, as quais Portugal, dada a sua intensa relação de dependência face aos mercados, apenas consegue reagir e não actuar, mas também dados os elevados incentivos à permanência num fundo de desemprego que a nossa sociedade permite em perpetuar.
E aqui surge talvez o maior problema de todos. Como solucionar o problema da economia portuguesa? Recorrendo ao Estado como empregador, aumentando o fardo no futuro ou corrigir os desequilíbrios estruturais da economia portuguesa ou promovendo uma estratégia concertada de promoção de exportações associada à criação de economias internas de escala?
Não é este o âmbito deste trabalho, mas muito do futuro português, em termos de segurança social, passa pela capacidade de se conseguir dotar o país de estruturas, capazes de gerarem por si só riquezas.
O Emprego ou a falta dele, causa um duplo problema nas contas públicas. Menos contribuições para a segurança social e mais subsídios gastos a título de compensações via fundo de desemprego.
Perante isto é possível afirmar, que o problema não se tem atenuado, pior é possível dizer que a falência vai acontecer.
Os Índices de dependência demográfica económica
O quadro acima, mostra que a partir de 2010, assiste-se a um agravamento do deficit das despesas correntes, em cerca de 41 por cento. É com base nestes dados, que se poderá calcular um diferencial entre as pensões e contribuições em quase 10% do PIB, a partir do ano de 2020. Por outras palavras a falência. Ou um intolerável aumento da carga fiscal.
Um Caminho Diferente: O Novo Paradigma
É verdade absoluta que as reformas nos sistemas nacionais de pensões deverão atenuar ou mesmo eliminar a diferença existente entre os beneficiários pela via demográfica e os beneficiários dos sistemas de pensões.
Como?
As prestações sociais e o seu peso no produto interno bruto português, tem registado ao longo dos tempos uma crescente importância, o que por si só não é suficientemente grave. Grave foi a forma como as prestações sociais, se transformaram numa espécie de garantibilidade de rendimento por parte do Estado.
A verdade é que a subida da esperança média de vida e o aumento da idade de entrada no mercado de trabalho, levam a que os sucessivos governos que por São Bento tenham passado, apenas consigam atenuar a dor, e nunca iniciar um cura de um sistema que se sabe, a continuar assim, não durará muito.
O actual esquema da segurança social, no que diz respeito às pensões, baseia-se em transferências dos recursos provenientes das contribuições para o sistema impostas, aos trabalhadores no activo para os actuais pensionistas. Assim, a razão de existência da segurança social, depende, da mera possibilidade, de quem hoje faz contribuições, ter a garantia que no futuro a mesma Segurança Social possuir receitas suficientes para as pagar quando se aposentarem.
O actual sistema é assumidamente insolvente.
Através da interferência governamental na poupança e no investimento, Paulo em 1940, poupa, pagando cem dólares ao sistema nacional de segurança social. Em troca, recebe um direito, que é virtualmente uma promessa incondicional de pagamento por parte do Governo. Se o Governo gastar os cem dólares em despesa corrente, não é criado nenhum capital adicional, e não resulta daqui, nenhum aumento na produtividade e no mercado de trabalho. A promessa de pagamento efectuada em 1940, é pois uma obrigação imposta, aos futuros contribuintes. Em 1970, um qualquer Pedro poderá ter que cumprir esta promessa, embora ele próprio não retire qualquer benefício do facto de um qualquer Paulo ter poupado cem dólares em 1940.
Os Paulos de 1940, não devem a si próprios. São os Pedros de 1970, que devem aos Paulos de 1940, resumindo, temos um sistema que privilegia o curto prazo. Os estadistas de curto prazo, resolvem o seu problema, transferindo-os para os estadistas de 1970. Nessa altura os estadistas de 1940, estarão na sua maioria mortos, ou serão velhos estadistas glorificando-se pela sua maravilhosa realização: a segurança social.
Assim, como forma de resolver o problema da sustentabilidade da segurança social, deverão ser empreendidas as seguintes medidas preparatórias ao novo modelo:
Um dos maiores desafios, é o aumento do número de contribuintes para o sistema da segurança social. Este desafio passa obrigatoriamente pela diminuição da actividade paralela, existente, e na qual, a fiscalização proveniente por parte do fisco, deverá assumir um papel de controlo central. Mas o modelo que a seguir apresentamos resolverá este problema. Tendo em atenção que a acumulação de capital é a única forma de garantir rentabilidade nos activos sob gestão, garantindo assim os pagamentos futuros. Ora isto só será possível com uma capitalização descentralizada, oferecido por fundos de pensões.
Muitos param por aqui, por temer o futuro da gestão dos activos, efectuados pelos fundos de pensões, porque qualquer investimento, implica risco e incerteza. A questão é que a manutenção do modelo actual, estamos a acumular passivos não cobertos no sistema actual. Ora, a manutenção do actual sistema, implicará um aumento drástico da carga fiscal ou a diminuição drástica dos benefícios concedidos.
Assim, o modelo de gestão da segurança social, o novo modelo que vamos designar de modelo único de protecção social funcionará da seguinte forma, tendo em conta os vários actores.
O Modelo Único de Protecção Social
A única obrigação do Estado Português consistirá no pagamento assumido de uma pensão única, igual para todos os contribuintes que tenham completado 65 anos de idade e 35 anos de descontos. O valor desta pensão futura será sempre igual ao salário mínimo nacional e será anualmente actualizada.
Esta pensão sofrerá penalizações, na casa dos 6,0 % por cada ano a menos de descontos.
Esquema de descontos actuais e futuros
O actual esquema de contribuições para a segurança social , subdivide-se entre :
1. Empresas : 24,5 % sobre o salário pago. 2. Contribuintes : 11,5 % sobre o salário bruto a receber.
Em conjunto empresas e contribuintes, pagam de forma directa e mensalmente 36 % para os cofres da segurança social.
Contribuições futuras de Assalariados
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